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É só uma carta

É só uma carta, pode fazê-la em poucos minutos, não pode ser assim tão caro! A minha sobrinha fala muito bem português, ela faz-me isso. Se for tradutor, provavelmente já ouviu algo semelhante de um possível cliente, conhecido, familiar ou amigo. Não vou falar de como este tipo de comentário pode ofender um tradutor profissional, pois penso que muito já foi dito sobre o assunto. Em vez disso, vou falar sobre o que uma “sobrinha que fala muito bem português” pode fazer com “apenas uma carta”.

1. Variante errada

Deseja contactar um possível cliente num país de expressão portuguesa; prepara a sua carta de apresentação, apresentando-se e apresentando a sua empresa a esse cliente. “É só uma carta”, por isso decide pedir à sua “sobrinha que fala muito bem português” para lha traduzir.  Assim, poupa dinheiro e “tem o trabalho feito”. Terá mesmo?

A sua “sobrinha que fala muito bem português” traduz-lhe a carta, mas como não tem conhecimentos acerca de problemas de localização, traduz a carta na variante que conhece. Contudo, o seu cliente não é falante nativo dessa variante, daí que para este, algumas palavras naquela carta podem não ser reconhecidas, ter um significado diferente ou existe até a hipótese que possam ser uma ofensa. No final, o seu possível cliente acha a sua carta confusa, não o leva muito a sério e desvaloriza a a sua carta. Nunca recebe uma resposta.

2. Termos técnicos

A sua “carta simples” contém também as especificações técnicas de diversas peças mecânicas que a sua empresa produz. Quer que o seu cliente conheça estes componentes, uma vez que poderão ser muito úteis na maquinaria da empresa deste. A sua “sobrinha” pode “falar muito bem português”, mas pode não estar familiarizada com os termos técnicos que utilizou nas suas especificações técnicas. Por isso, ela faz uma pesquisa no Google, ou “simplesmente” usa o Google Tradutor, afinal “é só uma carta” certo, por isso não fará mal nenhum de certeza. “Pode ser feita em apenas alguns minutos”.

No final, a sua “sobrinha” encontra termos que não são adequados àquela tradução em particular e o resultado é que o seu cliente não entende que peças a sua empresa produz e que interesse estas poderão ter para ele. Nunca recebe uma resposta.

Conclusão

Estes são “exemplos simples” de como uma má tradução pode danificar o seu negócio. Não significa que a sua “sobrinha” não “saiba falar português muito bem”, na realidade, ela pode até ser muito boa. Mas falar uma língua não a qualifica como tradutora, porque para ser tradutor precisa de saber as culturas com as quais está a lidar, para que esteja ciente do que é ou não culturalmente aceitável, tem de estar ciente de problemas de localização, para que possa fazer a transferência da mensagem correctamente. Mesmo sendo um tradutor profissional, não é capaz de traduzir em todos os campos. Alguns campos técnicos requerem tradutores especializados. Nós investimos o nosso tempo e dinheiro nessa especialização, daí que quando nos traz a sua “simples carta”, nós não dizemos “é só uma carta”, nós dizemos “eu vou ajudá-lo a conseguir este contrato”.